sexta-feira, 31 de março de 2017

Fantasmas que se cruzam

            A cidade é um cemitério. 
          Não importa a direção para qual eu me volte, sempre encontro amigos que poderiam me cativar, cafeterias onde eu poderia ser cliente assídua, avenidas que poderiam me contar mais histórias e amores que poderiam ser os meus. 
          A cidade abriga milhares de situações de "poderiam ter sido". Os fantasmas dessas realidades contrastantes perambulam bem à nossa frente no metrô. Eles falam ao celular, leem um livro com a capa amassada e tentam se equilibrar no vagão, assim como nós. De vez em quando, trocamos olhares. Dentro de mim há sempre a pergunta: "será que?". Será que se nós começarmos a conversar agora, o rumo da minha vida será diferente? Será que todas as minhas histórias e todas as histórias dele/dela cairão como um peso ali naquele instante? Será que tudo o que vivi até agora me trouxe a este momento?
         A cidade é uma missa de sétimo dia. Todos procuram superar algo, em qualquer lugar. Todos choram a morte do momento que já findou, da oportunidade que já passou, do amor que já partiu. Todos que cruzam o nosso caminho estão usando preto e andando com pesar. Todos têm um motivo para não querer cruzar a soleira da porta de casa. 
          Mas cruzam.
          Mas ousam.
          Mas seguem.
          A cidade é um cemitério onde cada um é uma aparição para o outro.

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